quarta-feira, 26 de setembro de 2012

José Oswald de Souza Andrade - Biografia


José Oswald de Souza Andrade era de família abastada. Ingressou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco (São Paulo) em 1909. (Só se formaria em 1919, quando seria o orador da turma.)
Publicou seus primeiros trabalhos em "O Pirralho", semanário paulista de crítica e humor, que ele mesmo fundou em 1911.
Em 1912, viajou para Paris, onde, convivendo com a boemia estudantil, entrou em contato com o futurismo e conheceu Kamiá, mãe de Nonê, seu primeiro filho, nascido em 1914. 
De volta a São Paulo, continuou no jornalismo literário. Em 1917, passou a viver com Maria de Lourdes Olzani (a Deise).
Defendeu a pintora Anita Malfatti de uma crítica devastadora de Monteiro Lobato e fundou o jornal "Papel e Tinta". Em seguida, ao lado de Anita, de Mário de Andrade e de outros intelectuais, organizou a Semana de Arte Moderna de 22.
Pelo espírito irreverente e combativo, nenhum outro escritor do modernismo ficou mais conhecido que Oswald. Sua atuação é considerada fundamental na cultura brasileira da primeira metade do século 20.
Publicou "Os Condenados" e "Memórias de João Miramar". Em 1924, iniciou o movimento Pau-Brasil, juntando o nacionalismo às idéias estéticas da Semana de 22. Em 1926, casou com a pintora Tarsila do Amaral, e os dois se tornaram a dupla mais importante das artes brasileiras (Mário de Andrade os apelidou de "Tarsiwald").
Oswald escreveu o "Manifesto Antropofágico", em que propôs que o Brasil devorasse a cultura estrangeira e criasse uma cultura revolucionária própria. Assim fariam Mário de Andrade em "Macunaíma" (1928) e Raul Bopp em "Cobra Norato" (1931).
Com a crise de 29, Oswald teve as finanças abaladas e sofreu uma reviravolta na vida. Rompeu com Mário, separou-se de Tarsila e casou com a escritora e militante política Patrícia Galvão (a Pagu). Da união nasceria Rudá, seu segundo filho.
Filiou-se ao PCB após a revolução de 1930 (romperia com o partido em 1945, embora continuasse sendo de esquerda). Em 1931, quando dirigia o jornal "O Homem do Povo", foi várias vezes detido.
Em 1936, após ter-se separado de Pagu, casou com a poetisa Julieta Bárbara. Em 1944, outro casamento, agora com Maria Antonieta D'Aikmin, com quem permaneceria até o fim da vida.
Além de poemas, já lançara o romance "Serafim Ponte Grande" (1933) e as peças "O Homem e o Cavalo" (1934) e "O Rei da Vela" (1937).
Em 1939, na Suécia, representou o Brasil num congresso do Pen Club (a entidade internacional que congrega os literatos dos diversos países). Prestou concurso para a cadeira de literatura brasileira na Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da USP com a tese "A Arcádia e a Inconfidência" e, em 1945, obteve o título de livre-docente.
Oswald morreu aos 64 anos. Sua poesia seria precursora de dois movimentos distintos que marcariam a cultura brasileira na década de 1960: o concretismo e o tropicalismo.

Obras de Oswald de Andrade

OBRAS
 
Humor:
·      Revista “O Pirralho” — crônicas em português macarrônico sob o pseudônimo de Annibale Scipione (1912 — 1917) 
 
Poesia: 
·      Pau-Brasil (1925)
·      Primeiro caderno do aluno de poesia Oswald de Andrade (1927)
·      Cântico dos cânticos para flauta e violão (1945)
·      O escaravelho de ouro (1946)

Romance:
·      A trilogia do exílio: I — Os condenados, II —A estrela de absinto, III — A escada vermelha (1922-1934)
·      Memórias sentimentais de João Miramar (1924)
·      Serafim Ponte Grande (1933)
·      Marco Zero: I - A revolução melancólica, II — Chão (1943).
·      Memórias: Um homem sem profissão (1954)

Teatro:
·      A recusa (1913)
·     Théâtre Brésilien — Mon coeur balance e Leur Âme (1916) (com Guilherme de Almeida)
·      O homem e o cavalo (1934)
·      A morta (1937);
·      O rei da vela (1937).
·      O rei floquinhos (1953)

Manifestos:
·     Manifesto da Poesia Pau-Brasil (1924)
·     Manifesto Antropófago (1928)
·     Manifesto Ordem e Progresso (1931)
·     Teses, artigos e conferências publicadas:
·     O meu poeta futurista (1921)
·     A Arcádia e a Inconfidência (1945)
·     A sátira na poesia brasileira (1945)

Versões e adaptações:
·     Filme “O homem do Pau-Brasil”, de Joaquim Pedro de Andrade, baseado na vida de Oswald de Andrade (1980)
·     Filme “Oswaldinianas”. Formado por cinco episódios, dirigidos por Julio Bressane, Lucia Murat, Roberto Moreira, Inácio Zatz, Ricardo Dias e Rogério Sganzerla (1992)

Publicações póstumas:
·     A utopia antropofágica – Globo
·     Ponta de lança – Globo
·     O rei da vela – Globo
·     Pau Brasil – Obras completas – Globo
·     O santeiro do mangue e outros poemas – Globo
·    Obras completas – Um homem sem profissão – Memórias e confissões sob as ordens de mamãe – Globo
·      Telefonema – Globo
·      Dicionário de bolso – Globo
·      O perfeito cozinheiro das almas desse mundo – Globo
·      Os condenados – A trilogia do exílio – Globo
·     Primeiro caderno do aluno de poesia Oswald de Andrade – Globo
·      Os dentes do dragão – Globo
·       Mon coeur balance – Le Âme - Globo

Memórias Sentimentais de João Miramar - Resumo


 
Obra:
Machado Penumbra abre o romance com um prefácio em que dá boas-vindas a João Miramar, saudando sua 'entrada de homem moderno na espinhosa carreira das letras'.
A partir daí, é narrada a trajetória desse novo escritor, sujeito ingênuo, educado na acanhada cidade de São Paulo, no começo do século. É um intelectual provinciano, cuja família rica vive da extração de café.
Na abertura, Miramar, ainda garotinho, é levado pela mãe ao oratório familiar e lá entre a imagem do manequim, propriedade materna, e a oração, o garoto pensa e reza:
'__ Senhor convosco, bendita sois entre as mulheres, as mulheres não têm pernas, são como o manequim de mamãe até em baixo. Para que perna nas mulheres, amém'.
Outra experiência do menino João recebe o título 'Gatunos de Crianças' e é assim condensada: 'O circo era um balão aceso com música e pastéis na entrada. E funâmbulos cavalos palhaços desfiaram desarticulações risadas para meu trono de pau com gente em redor. Gostei muito da terra da Goiabada e tive inveja da vontade de ter sido roubado pelos ciganos'. E, assim, em fragmentos, a trajetória de Miramar prossegue.
A viagem de navio à Europa vai destacando as cidades: manhã no Rio, Tenerife, Terra firme - Barcelona, Torre Eiffel, Milão, Vaticano, Sorrento, Veneza, etc. O namoro com Célia é assim apresentado: 'Vinham motivos como gafanhotos para eu e Célia comermos amoras em moitas de bocas. Requeijões fartavam mesas de sequilhos.
Destinos calmos como vacas quietavam nos campos de sol parado. A vida ia lenta como pontes e queimadas. Um matinal arranjo desenvolto de ligas morenava coxas e cachos'.
O casamento não passa sem registro: 'O Forde levou-nos para igreja e notário entre matos derrubados e a vasta promessa das primeiras culturas. Jogaram-nos flores como bênçãos e sinos tilintaram. A lua substituiu o sol na guarita do mundo, mas o dia continuou tendo havido entre nós apenas uma separação precavida de bens'. E a seguir, o nascimento do primeiro filho: 'Minha sogra ficou avó'.
O tempo passa e Miramar se apaixona por uma estrela de cinema, Madame Rolah, e a esposa logo percebem a ausência do marido: '... Não se esqueça de todas as minhas outras encomendas e traga também um par de sapatos de lona branca para Celiazinha. Vai a medida do pé. Temos tido muito calor nestes dias. Por que é que não me escreves? Veja se vem logo. Abraça-te e beija-te. Tua Célia'.
Mas, Miramar só tem olhos para a amante, passando dias maravilhosos com ela, enquanto a sogra e filhos percorrem a Europa, pedindo com frequência o envio de dinheiro: '... Nós não vamos embora para o Brasil porque mamãe tem medo dos sobre marinos. PS Vimos a Ponte dos Suspiros onde morreu Romeu e Julieta e tiramos um retrato pegando nas pombas. Nair'.
Os negócios vão mal, mas o romance com Rolah...: 'Ela me tinha confessado pela manhã que seus amores anteriores com pastores não tinham passado de pequenos flertes de criança. Agora quando tínhamos descido a escada longa eu me tinha baixado até os orquestrais cabelos louros. E tínhamo-nos juntando no grande doce e carnoso grude dum grande beijo mudo como um surdo'.
Célia descobre tudo e exige a presença do marido na Fazenda Bambus: 'Entrei em Higienópolis para jantar e sobre a mesa um telegrama azul exigia minha imediata presença nos Bambus. Célia sabia tudo laconicamente'.
A família é levada à falência e desonra: 'Higienópolis encheu-se às cornetadas da falência e desonra. Meu folhetim foi distribuído grátis a amigos e criados. E tia Gabriela sogra granadeiro grasnou graves grosas de infâmias. Entrava doméstico para comer e dormir longe de Célia. Os criados eram garçons de restaurante'.
As dívidas são muitas e têm de ser pagas: 'Eu e o conde e o Britinho éramos de semanas os autores mais citados na pendenga madura da sala de verdes audiências do Fórum Cível Paulista. Capinhas pretas enrouqueciam com pinga derredor das oblongas mesas zunzum com a lonjura de nossos privilegiados nomes protestada.
Primeiras praças anunciaram-se dos bens legados por inventário de mãe únicos válidos havidos para credores ante a Verdun contratual do separado casamento com Célia... '

A esposa falece e João Miramar decide interromper as memórias, motivando a seguinte entrevista: '__ Com que então o ilustre homem pátrio de letras não prossegue suas interessantíssimas memórias? ___ Não. ___Seria permitido ao grosso público ledor não ignorar as razões ocultas da grave decisão que prejudica assim a nossa nascente literatura? ___ Razões de estado. Sou viúvo de D. Célia. ___ Daí? ___ Disse-me o Dr. Mandarim que os viúvos devem ser circunspectos. Mais, que depois dos trinta e cinco anos, mezzo del camin di nostra vita, nossa atividade sentimental não pode ser escandalosa, no risco de vir a servir de exemplo pernicioso às pessoas idosas...'